20080103

Neologismos: Reproletarização (II)

Reproletarização: Em todo o caso, o fenómeno é directa consequência da privatização das funções sociais do Estado, que, a delegá-las ou "concessioná-las" em agentes privados - exclusivamente motivados pelo incentivo de lógicas do lucro máximo e mais rápido - o faz no pressuposto de dar prioridade à contenção de défices orçamentais públicos, desiderato por si só discutível, mesmo no contexto da teoria económica e das finanças públicas.

Assiste-se, por isso, ao alastramento do sistema e modo de produção capitalista norte-americano, impondo as suas lógicas triunfantes de mercado desregulamentado, em que poucas empresas multinacionais irão deter, em breve, o monopólio da produção de combustíveis, alimentos, fármacos, armas e tecnologias de informação e comunicação.

Tal significará a prevalência dos interesses dos consumidores sobre qualquer direito dos trabalhadores.

Mas significa, igualmente, o real e efectivo predomínio de colossais e avassaladores interesses económico-financeiros, que se moverão com o estrito objectivo de atingir o lucro máximo e influenciar a oscilação das mais-valias bolsistas, apesar de poderem não corresponder a um verdadeiro valor das empresas ou dos produtos transaccionados: a procura induzida e condicionada pela publicidade e pelo marketing determinará o preço.

O que equivalerá a reconhecer que o mercado neoliberal (o conceito não suscita consensos, pelo contrário; é utilizado para definir um sistema económico em que o Estado auto-circunscreve o seu âmbito de intervenção e regulação, deixando toda a margem de acção aos operadores privados) será determinado - e, em grande medida, decidido - por um grupo restrito de entidades (logo, de pessoas) sem qualquer representatividade democrática, que controlará pontos estratégicos e vitais do sistema económico, capturando verdadeiramente «o que resta dos Estados». Tratar-se-á de os indivíduos que dominam alguns sectores-chave nas autoridades de regulação (supostamente independentes), nos bancos centrais, nas administrações de empresas multinacionais se concertarem entre si para repartir mercados (de trabalho, produtos ou serviços) e áreas de influência económica ou política, sempre com alguma caução de legitimidade eleitoral, que lhes advirá de governos formais, que mais não serão do que agências de competitividade e de atracção de investimentos.

A concepção primordial do indivíduo como consumidor - tentando-se que todos os minutos da vida sejam «oportunidades» de transaccionar objectos, serviços, sensações e informação (J. Attali) - implicando a sua progressiva alienação da essência da pessoa humana, faz com que o «mercado» seja erigido em deus ex-machina.

Extensas camadas populacionais ver-se-ão, então, desprovidas de qualquer tipo de medidas de apoio ou segurança de solidariedade social, vindo a ficar à mercê de um mercado de trabalho em que as condições de emprego serão comparáveis às de países em vias de desenvolvimento.

(cont.)

1 comentário:

Justa Causa disse...

Desde o século XVIII que as críticas ao liberalismo são as mesmas.
Alguns pormenores:
Para além de ter permitido atingir níveis de sucesso económico e de bem estar geral pela humanidadde (nunca o mundo foi tão rico em todo o lado e a riqueza tão bem distribuída como agora - com excepção da maior parte de África, nunca a luta contra a fome e a doença foram tão eficazes.
nunca o bem estar dos trabalhadores por conta de outrém foi tão grande,
como desde o advento do liberalismo.
por outro lado nunca nenhum império foi tão benigno (tão menos dado a massacres, a destruições sistemáticas, a depredações, etc.) como o Império Americano.
cada vez que oiço um francês falar de direitos do homem desato a rir.
deve ser da pronúncia.

Ah não?
Basta dizer uma palavra: Ruanda.